Detalhes do E-book
A Atenção Primária à Saúde (APS) é reconhecida nacional e
internacionalmente como princípio norteador de sistemas de saúde integrais que
visam ampliar o acesso e a utilização dos serviços e das ações para alcançar a
Saúde Universal1
.
Para garantia de sua implementação, fortalecimento das suas estratégias e
sustentabilidade das propostas com vistas a viabilizar o acesso das pessoas aos
sistemas de saúde, a APS vem integrando importantes pautas na arena das políticas
públicas de saúde e intersetoriais em todo o mundo, como o recente movimento
comemorativo dos quarenta anos da Declaração de Alma-Ata, ocasião em que no
ano de 1978 os países membros da Organização Mundial da Saúde definiram um
elenco de proposições para garantir a saúde de todas as pessoas, elegendo a APS
como a principal e mais adequada forma de acesso à saúde2
.
Passadas pouco mais de quatro décadas da referida declaração, progressos
nos sistemas de saúde em todo o mundo são registrados com evidências positivas
de que a APS é o caminho para garantia da oferta de uma “Saúde Universal com
equidade, sem deixar ninguém para trás”
3
.
Mesmo com tantos avanços, ainda há muitos desafios que impedem o direito
do acesso à saúde por meio da APS, como a pobreza e a desigualdade, os modelos
de atenção pouco eficientes, sistemas de saúde fragmentados, os recursos
financeiros insuficientes, as limitações de governança e de liderança, além da falta
de investimento para a formação de profissionais4
.
Na realidade brasileira, tais desafios também podem ser verificados. No
entanto, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, um dos maiores
do mundo com acesso universal a serviços e ações de promoção da saúde, que
ocorreu quase que paralelamente ao movimento global de Alma-Ata, a APS tornouse a principal estratégia que possibilitou a ampliação equitativa do acesso à saúde, a
redução da mortalidade infantil e internações por condições sensíveis à APS, dentre
outras experiências que conferem seu reconhecimento3
.
A APS no Brasil, regida em sua maior parte pela Estratégia Saúde da Família
(ESF), é apontada como uma das principais contribuições para a organização do
SUS e melhoria da saúde da população brasileira5
.
Mais de 45 mil equipes da ESF atualmente são a porta de entrada no sistema
nacional de saúde, com a oferta de cuidado continuado e prestação de ações com
enfoque na promoção da saúde, prevenção de agravos, tratamento e reabilitação, o
que no conjunto de dispositivos do modelo de atenção à saúde brasileiro, a ESF
representa uma das inovações mais significativas na APS desde Alma-Ata6
.
Apesar das reconhecidas experiências exitosas da APS brasileira, os
obstáculos relacionados à formação profissional para atuação na Saúde da Família
(SF) ainda são um dos dificultadores que afetam a APS no País e que é objeto de
abordagem do livro ora em apreço.
O livro Entrelaços: Teoria e Prática na Atenção Primária à Saúde,
organizado por Gilmar Antonio Batista Machado, Jaqueline Silva Santos, Maria
Ambrosina Cardoso Maia e Raquel Dully Andrade, traz para o debate a necessária
articulação entre a construção do conhecimento e a experiência para a consolidação
da APS, contemplando aspectos motivadores que direcionam para o
desenvolvimento da formação profissional compromissada com os princípios
consensuados em Alma-Ata, mas, sobretudo com o SUS e a nossa sociedade . A teoria e prática na APS e seus entre laços apresentados no livro colocam
em cena aspectos de experimentação os quais foram objetos de produção de
conhecimento e de vivências de interação praticadas na universidade, no cotidiano
da assistência dos serviços de saúde e na gestão local, servindo-se dos referenciais
de saúde com abordagem sobre as conquistas e os desafios da APS nas últimas
décadas e o seu enfoque na gestão municipal, as experiências formativas por meio
das práticas de Educação Permanente em Saúde (EPS), a segurança do paciente, o
cuidado domiciliar, a saúde materno-infantil, a saúde do adolescente, as condições
crônicas, a saúde do idoso e a interface com a promoção da saúde, a equidade em
saúde na perspectiva das políticas públicas.
Ao contemplar a participação de 43 autores envolvidos com a docência, a
assistência e a gestão, o livro veio contribuir com a reflexão relativa ao processo de
formação e prática profissional para a APS, objeto de dedicação dos autores.
O livro foi organizado de forma a permitir que os leitores conheçam os
referenciais na APS e seus temas estratégicos para a formação e atuação
profissional em saúde a partir de mecanismos pedagógicos inovadores,
contemplando esquemas sintéticos em cada capítulo, avançando na sistematização
de questões para fixação da aprendizagem e da prática em fazer saúde. Uma
iniciativa híbrida entre descrição analítica, teórica, referencial da APS e exercícios
que favorecem a materialidade pela APS na prática.
O processo de integração entre a universidade, serviços de saúde e
comunidade marca a intencionalidade da elaboração deste livro. Tal integração
demonstra a necessidade de configuração do desenvolvimento profissional com
enfoque na APS como uma prática direcionada à comunidade e à prestação de
serviços de saúde com concepção crítico-social do mundo, do usuário e da
sociedade.
As evidências sobre a transformação dos modelos de educação das
profissões da saúde, direciona para a necessidade de se investir em iniciativas
capazes de promover mudanças no ensino, com incorporação de metodologias
ativas capazes de formar profissionais aptos à escuta, ao acolhimento e
responsabilização para com os usuários das ações e serviços de saúde e os
qualifiquem para a resolubilidade de suas práticas assistenciais. Nessa direção, a
orientação para formação com enfoque na APS é coerente com o que se propõe
como necessário para mudar o modelo assistencial hegemônico.
Retomo este livro em sua central dimensão. A APS constituída como um
projeto do Estado brasileiro para a proteção universal da saúde e que comporta a
ESF como estratégia adotada. Para tanto, precisamos desenvolver capacidades
para articular a teoria com a prática e garantir a potência que a APS apresenta em
sua totalidade. Assim, a proposição por inovações entre o que se produz e o que se
pratica recai sobre aqueles que acreditam nesse modelo, que são impulsionados por
lançar iniciativas que contribuam coma formação e a prática para a APS, para então
preparar os profissionais para atuarem no SUS, com a atenção integral e em equipe.
A dedicação e criatividade de organizar os textos em livro para a difusão e
compartilhamento das experiências em APS, desde as mais diversas perspectivas
que a compõem, é motivo de comemoração e alegria, sobretudo para aqueles que
desejam conhecer mais sobre como integrar teórica e prática.
O livro, além de fortalecer as bases conceituais da APS e seus antecedentes,
lança o chamado a partir de uma inequívoca proposta para promover o debate para
a práxis na APS, tão necessário nestes tempos de crise sanitária global pela COVID-19. Reafirmar o SUS, por meio de sua APS, como ordenador da formação em
recursos humanos em saúde é uma das mais valiosas contribuições desta obra.